O debate liberais vs desenvolvimentistas foi distorcido

Nos livros de história a gente aprende que os desenvolvimentistas do pós-guerra queriam industrializar o Brasil e os liberais queriam que o país só exportasse commodities e importasse manufaturas. Isso não é apenas mentira: Gudin, o mentor do liberalismo brasileiro à época, tinha planejado um esquema de proteção industrial com um grau de sofisticação inacreditável para a época.

Era assim:

1) As tarifas de importação não poderiam exceder 33% do valor do produto importado. Caso isso não fosse suficiente para o setor interno competir, estaríamos muito distantes da fronteira de produtividade, então estimulá-lo não seria ainda uma boa ideia.

2) Uma vez estabelecida a tarifa, a cada 5 anos uma comissão, composta pelos melhores técnicos nacionais e estrangeiros, iria avaliar o progresso de produtividade nas empresas dos setores protegidos, as possibilidades de melhoria e sugerir providências para consertar o que precisasse.

3) Algum tempo depois dessas avaliações, as tarifas seriam reduzidas para manter de pé apenas as firmas de maior produtividade daquele setor. Assim, quem não usou a proteção para aprender a produzir melhor iria quebrar, transferindo seus trabalhadores e bens de capital para as firmas melhores.

O homem em 1945 já falava em política de proteção com avaliação de desempenho e protocolo claro para não tornar o país refém de grupos de interesse (como estamos até hoje). Além da proteção temporária, que tinha como única finalidade permitir o estabelecimento de indústrias nascentes e não dar vida boa a empresário improdutivo, ele dava uma grande ênfase na educação, estabilidade monetária, garantia de direitos de propriedade e formação de poupança. Já estava intelectualmente na década de 90 em diante sem saber.

Falsificaram a história ao ponto de dizer que a agenda do Gudin era tornar o Brasil uma fazendona. O que mais entristece é que essa narrativa que está nos livros de história.

Vocês podem conferir o próprio Gudin debatendo com o mentor do desenvolvimentismo brasileiro nessa obra brilhante que o IPEA disponibilizou.

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