As dificuldades nas ciências sociais

A grande dificuldade de se adequar o método científico às ciências sociais deriva do fato de que, neste campo de conhecimento, não é possível isolar facilmente as variáveis.

Qualquer fenômeno social está sujeito a milhares – senão milhões – de interações simultâneas, cada uma produzindo seu impacto no resultado final. Deste modo, não é razoável estabelecer relações de causa e efeito tendo como base uma comparação simples entre presente e passado; afinal, estaríamos assumindo implicitamente que nada mais é capaz de afetar o curso da história na ausência da variável que estamos estudando (vamos chamar de X). No mundo social, coisas deste tipo simplesmente não ocorrem.

O desafio aqui consiste em isolar (na medida do possível) os impactos de X, estimando como a realidade se comportaria na sua ausência. Isso nunca poderá ser feito com exatidão, mas dá pra ter uma base mais precisa através de alguns métodos. Podemos, por exemplo, tentar entender quais são os fatores determinantes pra explicar o fenômeno em questão (seus fundamentos) e produzir um modelo. A partir do modelo, estimamos a realidade contrafactual (alternativa) e fazemos a comparação. Podemos também criar um grupo de controle artificial, ou seja, um grupo de regiões/países parecidos com o que está sendo analisado e que não foram afetados pelo evento X; e a partir desde grupo realizar a comparação. De qualquer modo, independente do método a ser utilizado, o princípio é o mesmo.

Exemplo de como boa parte dos veículos de informação (e até mesma partes da academia) ignoram estes princípios metodológicos básicos:

Recentemente, a subida das passagens aéreas foi noticiada na grande mídia como um fracasso da nova regra de bagagem. Parece correto, não? Adotamos novas regras para diminuir o preço das passagens e as passagens subiram. As regras não funcionaram. Mas espera, estamos fazendo a comparação errada. O preço das passagens é afetado por uma infinidade de coisas, como o preço do petróleo e do dólar (que subiram bastante). A única forma de isolar o impacto da nova regra de bagagem é estimar como o preço das passagens estariam sem ela. Agora complica um pouco, pois qual o método usado por estes veículos para fazer isso? Simplesmente nenhum.

Isso também se aplica à questão do armamento civil. Defensores do armamento costumam citar lugares e períodos onde as regras para se comprar arma apertaram e a criminalidade aumentou (ou onde as regras afrouxaram e a criminalidade caiu) como fracasso do desarmamento. Defensores do desarmamento, analogamente, costumam fazer o inverso. Espera aí, todo mundo deve concordar que as armas não são o único fator relevante para explicar a criminalidade. Como isolar as variáveis para realizar uma comparação honesta? Esse é o grande desafio.

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