A segunda metade da década de 1980 e a primeira metade da década de 1990 foram, do ponto de vista macroeconômico, anos marcados por elevadas taxas de inflação e de seguidas tentativas, os chamados “pacotes”, de debelá-las.
Em 1986, no bojo do processo de redemocratização, houve o Plano Cruzado. No ano seguinte houve o Plano Cruzado II. Em 1989, 1990 e 1991 foram tentados os Planos Verão, Collor e Collor II, respectivamente. Por fim, em 1994 houve o Plano Real. Cada um desses planos representou, em maior ou menor grau, uma oportunidade para que os economistas brasileiros, heterodoxos e ortodoxos, refinassem e testassem a sua compreensão acerca dos mecanismos subjacentes às altas taxas de variação dos preços domésticos, que começaram a ser observadas a partir dos estrangulamento das contas externas brasileiras após a crise da dívida externa dos países latino-americanos, no início da década de 1980.
O primeiro, o Cruzado, espelhou o entendimento dos economistas estruturalistas, então recentemente alçados ao poder, de que a inflação era um fenômeno eminentemente inercial, alicerçado em expectativas tornadas rígidas para baixo pela indexação generalizada da economia. Pretendeu-se por meio do congelamento dos preços, após a realização de um nada trivial cálculo – destinado, em tese, a preservar os preços relativos observados ao longo do tempo na economia – e da abolição parcial dos mecanismos de indexação, romper com a memória inflacionária dos consumidores e produtores. Supunha-se que os desequilíbrios fiscais seriam automaticamente sanados pelo ciclo econômico virtuoso que seria inaugurado pelo plano. As políticas redistributivas então introduzidas, porém, juntamente com a dificuldade para ajustar os preços relativos e com o descontrole dos gastos públicos, acabaram por jogar por terra o Plano.
O Plano Cruzado II, partindo de um diagnóstico semelhante, procurou ser mais comedido nas políticas redistributivas e nos gastos públicos, mas também não teve sucesso. O Plano Verão, por sua vez, limitou-se a interromper, por um curtíssimo período de tempo, a escalada dos preços.
O Plano Collor partiu do pressuposto de que a acentuada deterioração das expectativas em relação ao nível de preços devia-se à dificuldade do setor público para financiar seu déficit. Por este motivo, optou-se pelo congelamento de uma parte substancial dos recursos mantidos pela população nos bancos, os quais passaram a ser remunerados a taxas inferiores às previstas originalmente.
Certamente que o Plano Collor contribuiu para aliviar o desequilíbrio do setor público ao reduzir substancialmente tanto o estoque quanto o serviço de sua dívida. A questão da coordenação das expectativas e da recuperação fiscal do governo federal, contudo, permaneceu pendente. Assim, o plano em questão também fracassou, sendo que o Plano Collor II foi uma mera reedição das tentativas anteriores de romper a inércia inflacionária.
Somente o Plano Real, ao explicitar, no primeiro momento, uma cotação de venda do dólar dos EUA em termos da nova moeda nacional e ao aliviar o estrangulamento do setor público federal por meio do Fundo Social de Emergência – dando à União tempo para que a carga tributária fosse aumentada, especialmente por intermédio de contribuições, e para que o esforço arrecadador fosse intensificado –, permitiu que as expectativas convergissem de forma satisfatória.
Assim, podemos concluir que houve um autêntico aprendizado sobre os fatores determinantes dos altos índices inflacionários. Não por coincidência, muitos dos mentores do Plano Cruzado também foram os mentores do Plano Real.
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