Fundamentos 01 – Conjuntos

The theory of sets is a language that is perfectly suited to describing and explaning all types of mathematical structures.”

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Aviso ao Leitor

Bem-vindo ao início de uma jornada consideravelmente longa. A primeira parte desse projeto é um resumo (mais conciso e menos didático) do livro do professor Richard Hammack. O objetivo desse manual é servir como material de revisão e auxílio aos que quiserem seguir o caminho proposto no Projeto Matemática do nosso site. A leitura do material original é fortemente indicada e encorajada por parte dos que elaboraram o presente manual. Os exercícios contidos no livro, por outro lado, são obrigatórios. Você deve tentar resolver o máximo possível. Quaisquer dúvidas podem ser enviadas nos comentários do projeto.

Todos os posts estão compilados em um pdf disponível no meu github. Link para download.

Um conjunto (set) é uma lista de elementos. Normalmente denotados por uma letra maiúscula. Por exemplo:

A = \{1 , 2 , 3 , 4 , ... \}

Regra: Dois sets A e B são iguais se possuírem exatamente os mesmos elementos, não importando a ordem desses elementos dentro de cada set.

Vamos definir um símbolo para sinalizar se um determinado elemento (x) pertence ou não a um determinado set qualquer (A). Para tal relação usaremos o símbolo ``\in" se x for um elemento de A ou, caso contrário, usaremos ``\notin" se x não for um elemento de A.

É provável que, em algum momento, seja necessário contar a quantidade de elementos em um dado set qualquer A. Chamaremos essa relação de cardinalidade ou tamanho do set A. O símbolo usado será duas barras em volta do set do seguinte modo: ``|A|".

A partir dessas duas relações já podemos definir um tipo especial de set. Vamos definir como conjunto vazio ou empty set um conjunto que possua o cardinal igual a zero. Usaremos o símbolo `` \ \emptyset \ " para definir a relação a seguir:

|\emptyset| = 0

Em várias situações não vale a pena construir sets apenas com uma lista-exemplo de alguns dos seus elementos. Imagine um set de todos os números pares, por exemplo, ou um set de todos os números que começam com 3 e terminam com 4 ou qualquer outra regra mais específica. Para essas situações usamos a notação de formação de conjuntos (set builder notation). Como no exemplo abaixo:

E = \textcolor{#ff0000}{ \{ } \textcolor{#0000ff}{2n} \textcolor{#00ff00}{:} \textcolor{#7a2500}{n} \textcolor{#f69457}{\in} \ \mathbb{Z \}}

A matemática é uma linguagem que consegue dizer muita coisa com poucos símbolos. Ao longo desse curso, você será capaz de ler esses símbolos e compreender corretamente o que o autor quis dizer por meio deles. Para facilitar essa primeira leitura, eu colori cada símbolo da expressão acima com a cor correspondente da passagem a seguir. Perceba como um pequeno símbolo pode significar bastante coisa. A leitura da expressão acima é: “O conjunto E é igual ao \textcolor{#ff0000}{conjunto \ dos \ elementos \ da \ forma} \textcolor{#0000ff}{\ 2n} \textcolor{#00ff00}{\ tal \ que} \textcolor{#7a2500}{\ n} \textcolor{#f69457}{\ e \ um \ elemento \ do \ conjunto } \ \mathbb{Z} “.

Podemos resumir essa notação de formação de conjuntos como “Conjunto = {Expressão : Regra}”. É bem comum vermos notações onde os dois pontos são trocados por uma barra: “Conjunto = {Expressão | Regra}”. Nesse livro o autor preferiu a notação com dois pontos.

Existem alguns conjuntos que são famosos ao ponto de terem nomes e símbolos próprios.

\emptyset = \{ \} . Conjunto Vazio

\mathbb{N} = \{ 1, 2, 3, 4, … \} . Conjunto dos Naturais

\mathbb{Z} = \{ …, -2, -1, 0, 1, 2, … \} . Conjunto dos Inteiros

\mathbb{Q} = \{ x : x = m/n, \ onde \ m,n \in \mathbb{Z} \ e \ n \neq 0 \} . Conjunto dos Racionais

A Reta Real

Como o conjunto dos número reais pode ser descrito como pontos em uma reta numérica infinita. Se tivermos dois pontos quaisquer a e b, de modo que a , b \in \mathbb{R} e a < b, temos infinitos elementos entre esses dois pontos. Por causa dessa propriedade, teremos que usar um novo símbolo para se referir aos conjuntos que são melhor descritos em termos de intervalos entre pontos. Abaixo coloquei uma coluna com uma representação gráfica e, ao lado, uma coluna com a respectiva definição por set builder notation.

Produto Cartesiano

Definição: Um par ordenado é um lista na forma (x, y) que contém dois elementos (nesse caso, um x e um y). Esses dois elementos ficam entre parênteses e separados por uma vírgula.

Atenção: Atente para o fato de que (x,y) \neq (y,x).

Agora que temos a definição de par ordenado. Podemos escrever conjuntos usando esse novo conceito.

Definição: O produto cartesiano de dois sets A e B é um outro set cujo símbolo é ``A \times B" e é definido como:

A \times B = \{ (a,b) : a \in A, b \in B \}

Perceba que, se A e B são finitos, então | A \times B | = |A| \ . \ |B|. Ou seja, o cardinal do produto cartesiano de dois sets é igual à multiplicação dos cardinais dos dois conjuntos.

Podemos construir um produto cartesiano onde os conjuntos A e B são iguais. Por exemplo: \mathbb{R} \times \mathbb{R} = \{ (x,y) : x,y \in \mathbb{R} \}.

Para simplificar essa expressão onde temos um produto cartesiano de sets iguais, vamos criar um novo conceito que chamaremos de potência cartesiana (cartersian power). Desse modo, podemos definir o exemplo de ``\mathbb{R} \times \mathbb{R}" como simplesmente ``\mathbb{R}^2". Mais genericamente, dizemos que, para qualquer set A e um n positivo, o cartesian power A^n será definir como:

A^n = \underbrace{A \times A \times ... \times A}_\text{n \ vezes} = \{ (x_1,x_2, ... , x_n) : x_1,x_2, ... , x_n \in A \}

Subconjuntos

Nós já aprendemos a relacionar elementos e conjuntos, mas agora vamos definir um método de relacionar conjuntos entre si. A primeira relação que vamos explorar é a que expressa a situação onde todos os elementos de um conjunto também são elementos de outro conjunto.

Definição: Suponha que existam dois sets A e B. Se todos os elementos de A também forem elementos de B, dizemos que A é um subconjunto (subset) de B. O símbolo usado para expressar essa relação é ``\subseteq", ou seja, A \subseteq B quer dizer que A é subconjunto de B. Caso exista um elemento de A que não seja um elemento de B, então escrevemos que A \nsubseteq B.

Atenção 1: Uma consequência direta dessa definição de subconjunto é o fato de que \emptyset \subseteq B para qualquer conjunto ``B". A demonstração dessa afirmação é simples: suponha que exista algum conjunto Z onde \emptyset \nsubseteq Z. Isso significaria que existe algum x \in \emptyset que não é um elemento de Z, ou seja, x \notin Z. Mas, por definição, x \notin \emptyset, desse modo, \emptyset \subseteq Z.

Atenção 2: É trivial o fato que dado um conjunto qualquer A, todos os elementos de A pertencem a ele mesmo. Isso implica que A \subseteq A. Portanto, todo conjunto é subconjunto de si mesmo.

Atenção 3: Como vimos antes: \emptyset \subseteq B, para qualquer set B. Acontece que também é verdadeiro o fato de que \emptyset \subseteq \emptyset. Uma vez que, se \emptyset \nsubseteq \emptyset existiria algum x de modo que x \in \emptyset e x \notin \emptyset, o que é uma clara contradição.

Conjunto de Partes

Definição: Dado um set qualquer B, o seu conjunto de partes ou power set será outro set escrito como \mathscr{P}(B) e definido como:

\mathscr{P}(B) = \{ X : X \subseteq B \}

Dica: Tem bastante informação interessante no livro. Como esse aqui é só um resumo, não vou entrar muito em detalhes além da definição. Mas recomendo a leitura do material original.

União, Intersecção e Diferença

Já vimos como podemos relacionar conjuntos por produto cartesiano para gerar outros conjuntos. Agora vamos expandir ainda mais nosso ferramental de operações entre conjuntos.

Definição: Dados dois conjuntos F e G, a união entre eles será um novo set denotado por ``F \cup G" e definido como:

F \cup G = \{ x : x \in F \ ou \ x \in G \}

Definição: Sejam dois conjuntos F e G. A intersecção entre eles será um novo set denotado por ``F \cap G" e definido como:

F \cap G = \{ x : x \in F \ e \ x \in G \}

Definição: Sejam dois conjuntos F e G. A diferença entre eles será um novo set denotado por ``F - G" e definido como:

F - G = \{ x : x \in F \ e \ x \notin G \}

Dica: Esses conceitos são muito importantes. Mas para o nosso curso não ficar muito grande, vou me manter só nos conceitos também. Leia o material original caso tenha dificuldade.

Complemento

Quando lidamos com conjuntos é comum supor que há um conjunto maior que contém todos os outros. Esse set geral chamamos de conjunto universo ou conjunto universal.

Definição: Sejam um conjunto qualquer H e o seu conjunto universo U. O complemento de H é um novo set denotado por ``\overline{H}" e definido por:

\overline{H} = U - H

Diagramas de Venn

Essa sessão eu pulei integralmente. Diagramas de Venn são ótimos pra se ter uma intuição sobre todos os conceitos que vimos até agora, mas não são usados para provas matemáticas. Ainda vale a leitura do capítulo.

Conjuntos Indexados

Às vezes é necessário trabalhar com uma quantidade consideravelmente grande de conjuntos. Para esses casos, usamos uma técnica de simplificação que é adicionar um índice numérico subscrito à alguma letra maiúscula. Desse modo, ao invés de trabalharmos com sets A, B e C, podemos trabalhar com os sets A_1, A_2 e A_3.

Podemos relacionar esses subscritos à um outro set. O nome dado a esse set é conjunto índice (index set). Nos exemplos acima, podemos dizer que todos os subscritos pertencem ao conjunto \{ 1 , 2 , 3 \}.

Agora podemos adicionar essa técnica às relações de união e intersecção entre esses conjuntos indexados para um número arbitrariamente grande. Além disso, vamos usar uma notação similar a do somatório para definir essas relações.

Definição (União de Sets Indexados): Dados os conjuntos A_1, A_2, A_3, \dots, A_n e o index set I = \{ 1 , 2 , \dots , n \}, temos que

\bigcup_{i \in I}\limits = \{ x : x \in A_i \ para \ algum \ A_i, \ onde \ i \in I \}

Definição (Intersecção de Sets Indexados): Dados os conjuntos A_1, A_2, A_3, \dots, A_n e o index set I = \{ 1 , 2 , \dots , n \}, temos que:

\bigcap_{i \in I}\limits = \{ x : x \in A_i \ para \ todo \ A_i, \ onde \ i \in I \}

O livro tem dois exemplos bem interessantes da aplicação dos conceitos que acabamos de definir. A essa altura você deve conseguir entender os dois.

Conjuntos que são Sistemas Numéricos

A maioria dos conjuntos que trabalhamos são conjuntos que possuem estruturas e propriedades especiais. No caso dos conjuntos numéricos tomamos como certo que os seus elementos podem ser somados, multiplicados e possuem relações que obedecem as regras que passamos todo o ensino infantil, fundamental e médio aprendendo e aplicando. Como esse livro é introdutório, todas essas características clássicas dos sistemas numéricos serão tomadas como verdade. Mas saiba que as relações que achamos ser naturais possuem comprovações bastante complexas, que você pode procurar por conta própria.

Aqui o autor elenca algumas propriedades que tomaremos como verdadeiras sem que sejam devidamente definidas e demonstradas:

  • Propriedade Comutativa/Associativa/Distributiva da Adição/Subtração/Multiplicação/Divisão
  • Ordenação natural dos elementos numéricos de \mathbb{R}
  • Os subconjuntos de \mathbb{N} obedecem ao Princípio da Boa Ordenação.

Comentário: Agora a gente vai adentrar um pouco nas propriedades que podemos derivar desses pressupostos acima. Pode parecer que é um papo chato, mas a sua missão é se certificar que você é capaz de compreender toda a explicação. Vença a preguiça.

Uma conclusão que podemos tirar do princípio da boa ordenação é que dado um conjunto não nulo qualquer A \subseteq \mathbb{N} sempre vai haver um x_0 \in A que seja o seu menor elemento. De modo parecido, para qualquer b \in \mathbb{Z}, qualquer conjunto não nulo A \subseteq \{ b, b+1, b+2, b+3, \dots \} também possui um menor elemento.

Definição (Division Algorithm): Sejam dois inteiros a e b, onde b > 0. Existem outros dois inteiros únicos q e r para os quais a = qb + r e 0 \leq r < b.

Agora o autor demonstra a existência de r e q com suas propriedades. Talvez depois eu estenda a prova para a unicidade desses valores (pode me cobrar nos comentários).

Demonstração (Division Algorithm): Dados a,b \in \mathbb{Z} e b > 0, é possível criar um set do tipo:

A = \{ a - xb : x \in \mathbb{Z}, 0 \leq a - xb \} \subseteq \mathbb{N}^0

Desse modo, A \subseteq \mathbb{N}. Por causa disso, podemos aplicar o princípio da boa ordenação em A e dizer que existe algum elemento r que seja o menor elemento de A.

Como r \in A, ele pode ser escrito da forma r = a - qb, onde x = q \in \mathbb{Z}. Desse fato podemos tirar duas informações úteis: 1) a = r + qb e 2) Como r \in \mathbb{N}^0, então r \geq 0.

Agora só nos resta provar que r < b, mas para isso, vamos usar o pensamento contrário: o que aconteceria se r \geq b?

Ora, se r \geq b, então a subtração r - b será um número positivo, portanto será também um elemento de \mathbb{N}^0. Podemos reescrever essa subtração como r - b = (a - qb) - b = a - (q + 1)b.

Mas veja só que estranho: q + 1 certamente será um elemento de \mathbb{Z}. Logo, o número expresso por a - (q + 1)b também será um elemento de A (nesse caso, (q + 1) é o x). Portanto, não é possível que r seja o seu menor elemento, visto que r - b também é um elemento de A e é menor que r. Isso é uma clara contradição. Isso é justamente o que queríamos mostrar: quando tomamos r \geq b acabamos com uma contradição, portanto, sabemos que r < b. E com isso finalizamos a demonstração da existência de r e q \blacksquare.

O Paradoxo de Russell

Até agora trabalhos a distinção entre “elementos” e “conjuntos”. Mas, na verdade, qualquer número (ou seja, elemento de sets numéricos) pode, sim, ser interpretado como um conjunto. Existe um mundo de teoria sobre conjuntos, nós não temos tempo pra entrar muito fundo nessa questão. Então vá atrás de livros sobre teoria dos conjuntos e seja feliz. Até mesmos as operações matemáticas podem ser definidas usando-se teoria dos conjuntos. O autor vai até mais longe: “Qualquer entidade matemática é um conjunto, mesmo que não escolhamos pensar desse modo“.

Essa parte do paradoxo de Russell não serve para o resto do livro mas é bem legal de saber. O que Bertrand Russell propôs foi o seguinte conjunto:

A = \{ X : X é um set e X \notin X \}. Ou seja, A é formado por todos os conjuntos que não possuem a si mesmo como elemento.

E então ele perguntou: “O conjunto A é um elemento de si mesmo?“.

Dica: Leia o livro nessa parte. O professor explica bem melhor sobre o paradoxo.

Dessa maneira terminamos o capítulo 01 do livro. Reveja sempre que necessário e tente fazer os exercícios do livro. Qualquer dúvida, sinta-se livre para compartilhar aqui nos comentários. Até logo!.

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Leia toda a série do Projeto Matemática aqui.

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