Fundamentos 03 – Contagem (parte 03)

O Triângulo de Pascal e O Teorema Binomial

Até aqui você é capaz de resolver qualquer problema que envolva contagens de listas e subconjuntos seja usando todos os valores disponíveis ou apenas uma parte deles. Uma coisa interessante da matemática é que alguns padrões surgem à medida que se cria novos conceitos.

Um desses padrões foi descoberto em vários países em épocas diferentes, mas o nome que usaremos é atribuído ao matemático francês Blaise Pascal e é denominado Triângulo de Pascal.
A relação é simples:

\displaystyle {n+1 \choose k} = {n \choose k-1} + {n \choose k}


Ou seja, o número de subconjuntos que podemos formar com a adição de apenas 1 elemento no universo de opções é igual à soma dos totais de subconjuntos de tamanho {k-1} das opções originais com a quantidade de subconjuntos de tamanho {k} das {n} opções originais. Parece um pouco chato todo esse papo, mas se certifique que está acompanhando.

Para verificar se o triângulo de Pascal é verdadeiro, vamos começar quebrando a equação e desenvolvendo suas formas completas:

\displaystyle {n+1 \choose k} = \frac{(n+1)!}{k!(n+1-k)!}


e

\displaystyle {n \choose k-1} + {n \choose k} = \frac{n!}{(k-1)![n-(k-1)]!} + \frac{n!}{k!(n-k)!}


Não se assuste, foram apenas pequenas alterações feitas na formulação clássica de {n \choose k}. Escreva em um papel para se certificar que entendeu.

A próxima parte é bem feia e pode assustar, mas é simplesmente uma soma de frações comum do estilo {\frac{a}{b} + \frac{c}{d} = \frac{ad+cb}{bd}} aplicada equação para {{n \choose k-1} + {n \choose k}}:

\displaystyle {n+1 \choose k} = \frac{n!k!(n-k)!}{k!(n-k)!(k-1)!(n-k+1)} + \frac{n!(n-k+1)!}{k!(n-k)!(k-1)!(n-k+1)!}

\displaystyle {n+1 \choose k} = \frac{n!k!(n-k)! + n!(n-k+1)!}{k!(n-k)!(k-1)!(n-k+1)!}


Para ficar mais fácil de visualizar vamos abrir os fatoriais {k!} e {(n-k+1)!}:

\displaystyle {n+1 \choose k} = \frac{n!k(k-1)!(n-k)! + n!(k-1)!(n-k+1)(n-k)!}{k!(n-k)!(k-1)!(n-k+1)!}


Perceba que temos {(k-1)!(n-k)!} em ambas as parcelas da soma podemos transformar isso em:

\displaystyle {n+1 \choose k} = \frac{(n-k)!(k-1)![n!k+n!(n-k+1)]}{(k-1)!(n-k+1)!k!(n-k)!}

\displaystyle {n+1 \choose k} = \frac{\cancel{(n-k)!(k-1)!}[n!k+n!(n-k+1)]}{\cancel{(k-1)!(n-k)!}(n-k+1)!k!}

\displaystyle {n+1 \choose k} = \frac{n!k + n!(n-k+1)}{k!(n-k+1)!}


Opa, chegamos em um ponto interessante! Temos ambos os divisores (a parte de baixo da divisão) iguais, agora resta mostrar que os dividendos (a parte de cima da divisão) são iguais. Para que fique mais limpo, trabalharemos com os dividendos separadamente. Agora só temos que provar essa pequena igualdade:

\displaystyle (n + 1)! = n!k + n!(n - k + 1)


Primeiramente, relembremos:

\displaystyle (n+1)! = (n+1)\underbrace{(n)(n-1)...3.2.1}_{ \ Isso \ aqui \ é \ igual \ a \ n!}


Então podemos simplificar a equação restante como

\displaystyle (n+1)n! = n!k + n!(n-k+1)

\displaystyle (n+1)\cancel{n!} = \cancel{n!}k + \cancel{n!}(n-k+1)

\displaystyle (n+1) = k + n - k + 1

\displaystyle (n+1) = \cancel{k} + n\cancel{-k}+1

\displaystyle (n+1) = (n+1)


Com divisores e dividendos iguais, concluímos que:

\displaystyle {n+1 \choose k} = {n \choose k-1} + {n \choose k} \blacksquare


Tendo mostrado que essa propriedade é verdadeira, podemos ver como o Triângulo de Pascal é verdadeiro. Você com certeza viu isso, mas em formato de pirâmide. Aqui é um Triângulo Retângulo de Pascal.

{0} {1} {2} {3} {4} {5} {\cdots} {k}
{0} \tiny {0 \choose 0}
{1} \tiny {1 \choose 0} \tiny {1 \choose 1}
{2} \tiny {2 \choose 0} \tiny {2 \choose 1} \tiny {2 \choose 2}
{3} \tiny {3 \choose 0} \tiny {3 \choose 1} \tiny {3 \choose 2} \tiny {3 \choose 3}
{4} \tiny {4 \choose 0} \tiny {4 \choose 1} \tiny {4 \choose 2} \tiny {4 \choose 3} \tiny {4 \choose 4}
{5} \tiny {5 \choose 0} \tiny {5 \choose 1} \tiny {5 \choose 2} \tiny {5 \choose 3} \tiny {5 \choose 4} \tiny {5 \choose 5}
{\vdots}
{n} \tiny {n \choose 0} \tiny {n \choose 1} \tiny {n \choose 2} \tiny {n \choose 3} \tiny {n \choose 4} \tiny {n \choose 5} \tiny {n \choose k}

Fazendo os devidos cálculos pela aplicação para todos os casos {{n \choose k}} teremos:

{0} {1} {2} {3} {4} {5} {\cdots}
{0} {1}
{1} {1} {1}
{2} {1} {2} {1}
{3} {1} {3} {3} {1}
{4} {1} {4} {6} {4} {1}
{5} {1} {5} {10} {10} {5} {1}
{\vdots} {\vdots} {\ddots}

Para prosseguirmos, o professor Hammack usa os exercícios 3.5.13 e 3.5.14 como ferramentas para expor algumas implicações do triângulo de Pascal.

Exercício 3.5.13: Suponha que {n,k \in \mathbb{Z}} e {0 \leq k \leq n}. De posse da fórmula da combinação \tiny {{n \choose k} = \frac{n!}{k!(n-k)!}}, demonstre que \tiny { {n \choose k} = {n \choose {n-k}} }.

A resposta para essa questão está no solucionário do próprio livro. Assumindo que { n,k \in \mathbb{Z} } e { 0 \leq k \leq n }, aplicando o conceito das combinações podemos ver que

{ {n \choose n - k} = \frac{n!}{(n-k)![n-(n-k)]!} = \frac{n!}{(n-k)![n-n+k)]!} = \frac{n!}{(n-k)![\cancel{n-n}+k)]!} = \frac{n!}{(n-k)!k!} = {n \choose k} \blacksquare}

Exercício 3.5.14: Suponha que {n,k \in \mathbb{Z}} e {0 \leq k \leq n}. Usando apenas a definição de combinação da página 31 (sem usar a fórmula), demonstre que \tiny { {n \choose k} = {n \choose {n-k}} }.

Para responder essa questão nós vamos ter que abordar 3 casos possíveis. Quando temos { k = n }, estamos dizendo que queremos saber quantos subconjuntos de tamanho {n} podemos fazer com {n} elementos, cuja resposta é claramente 1. Quando temos { k = 0 }, só temos 1 subconjunto possível, que é o conjunto vazio {\emptyset}. Ou seja (se você leu o capítulo 02, você entendeu o que a gente quis dizer aqui), {(k = 0 \ \lor \ k = n) \implies {n \choose k} = {n \choose n - k} = 1}. Esses são os casos das laterais do triângulo de Pascal.

Agora teremos que trabalhar com os casos onde {0 < k < n}. Dentro dessa situação, temos o caso onde {k = n/2}. Nesse caso, é simples ver que {{n \choose k} = {n \choose \frac{n}{2}} = {n \choose n - \frac{n}{2}} = {n \choose \frac{n}{2}} = {n \choose n - k}}. Agora que já eliminamos todos os casos mais evidentes, precisamos desenvolver uma lógica que contemple todos os demais.

Primeiro vamos pensar num conjunto qualquer {N}. Como estamos contando subconjuntos, se {N} possuir elementos repetidos, isso não nos afeta, visto que um conjunto não leva em consideração a ordem nem elementos repetidos. Para nos certificarmos, vamos criar um subconjunto {N^* = \{n \in N : n_k \neq n_w \ \forall \ k \neq w \}}. Esse conjunto {N^*} não tem nenhum elemento repetido. Primeiro, vamos contar todos os subconjuntos de tamanho {k} de {N^*}. Cada subconjunto {k_i \subseteq N^*} será do tipo {\{n_1,n_2,n_3,...,n_k\}}. Uma vez que formamos um conjunto {k_i} ainda teremos {n - k} elementos “sobrando” para criarmos novos subconjuntos. Desse modo, teremos um total de {k(n-k)} possibilidades. Do outro lado do problema, vamos pensar no caso para os subconjuntos de tamanho {(n-k)}. Eles serão do tipo {\{n_1,n_2,...,n_{n-k}\}}. Similarmente, para cada subconjunto com {(n-k)} elementos, teremos {n-(n-k)=n-n+k=k} elementos “sobrando” para construirmos novos subconjuntos, o que também nos dá um total de {k(n-k)} subconjuntos possíveis. Como temos o mesmo número de possibilidades, fica demonstrada a simetria entre {{n \choose k}} e {{n \choose n-k}} de acordo com o enunciado da questão. {\blacksquare}

Com a demonstração dos exercícios 3.4.13 e 3.4.14, nós podemos ver que o triângulo de Pascal possui uma simetria. Começando pelas laterais, as colunas onde {k = 0} e {k = n} são sempre iguais a {1}. Mas além dessas, as colunas intermediárias também possuem uma simetria dada por {{n \choose k} = {n \choose n-k}}. Isso quer dizer que as segundas colunas sempre serão iguais às penúltimas. Do mesmo modo, as terceiras colunas sempre serão iguais às antepenúltimas. Nos casos onde o {k} é ímpar, teremos uma coluna do meio que será a única sem uma repetição do valor.

A partir dessa simetria, os matemáticos perceberam uma relação entre os valores de cada elemento das linhas do triângulo de Pascal com os coeficientes dos binômios do tipo {(a+b)^n}. Esse fato é chamado de Teorema Binomial. Como o nome diz, um binômio é formado por quaisquer dois números (chamados de monômios) {a} e {b} relacionados por uma soma.

Veja só que interessante:

{(a+b)^0 = \textcolor{red}{1}}
{(a+b)^1 = \textcolor{red}{1}a + \textcolor{red}{1}b}
{(a+b)^2 = \textcolor{red}{1}a^2 + \textcolor{red}{2}ab + \textcolor{red}{1}b^2}
{(a+b)^3 = \textcolor{red}{1}a^3 + \textcolor{red}{3}a^2b + \textcolor{red}{3}ab^2 + \textcolor{red}{1}b^3}
{(a+b)^4 = \textcolor{red}{1}a^4 + \textcolor{red}{4}a^3b + \textcolor{red}{6}a^2b^2 + \textcolor{red}{4}ab^3 + \textcolor{red}{1}b^4}
{(a+b)^5 = \textcolor{red}{1}a^5 + \textcolor{red}{5}a^4b + \textcolor{red}{10}a^3b^2 + \textcolor{red}{10}a^2b^3 + \textcolor{red}{5}ab^4 + \textcolor{red}{1}b^5}
{(a+b)^6 = \textcolor{red}{1}a^6 + \textcolor{red}{6}a^5b + \textcolor{red}{15}a^4b^2 + \textcolor{red}{20}a^3b^3 + \textcolor{red}{15}a^2b^4 + \textcolor{red}{6}ab^5 + \textcolor{red}{1}b^6}
{(a+b)^7 = \textcolor{red}{1}a^7 + \textcolor{red}{7}a^6b + \textcolor{red}{21}a^5b^2 + \textcolor{red}{35}a^4b^3 + \textcolor{red}{35}a^3b^4 + \textcolor{red}{21}a^2b^5 + \textcolor{red}{8}ab^6 + \textcolor{red}{1}b^7}

Perceba como os coeficientes em vermelho seguem exatamente o padrão estabelecido pelo triângulo de Pascal. Nós vamos partir dessa constatação para a definição do teorema binomial. Relaxa que a gente vai indo em partes.

Os primeiros e últimos termos do binômio estão à n-ésima potência, (deixaremos {a^{n-n}} multiplicando o último termo e {b^{n-n}} o primeiro, apenas para que o desenvolvimento fique mais claro, afinal, é um número elevado a zero e não mudará nosso resultado). Portanto:

\displaystyle (a+b)^n = a^nb^{n-n} + \cdots + a^{n-n}b^n


Agora veja que no segundo termo do binômio temos {a^{n-1}b^1} e no penúltimo {a^1b^{n-1}}

\displaystyle (a+b)^n = a^nb^{n-n} + a^{n-1}b^1 + \cdots + a^1b^{n-1} + a^{n-n}b^n


Por fim, falta apenas incluir os coeficientes, que, como dito antes, seguirão por padrão a k-ésima entrada da n-ésima linha do Triângulo de Pascal:

\displaystyle (a+b)^n = {n \choose 0}a^nb^{n-n} + {n \choose 1}a^{n-1}b^1 + \cdots + {n \choose n-1}a^1b^{n-1} + {n \choose n}a^{n-n}b^n


Um fator importante para a notação mais limpa é que {a} está sempre elevado a {n} subtraído a k-ésima entrada, e {b} está sempre elevado a k-ésima potência.

Pronto. Com isso já conseguimos definir nosso teorema.

Teorema Binomial Se {n} é um inteiro não negativo, então:

\displaystyle (a+b)^n = {n \choose 0}a^{n-0}b^{0} + {n \choose 1}a^{n-1}b^1 + \cdots + {n \choose n-1}a^1b^{k-1} + {n \choose n}a^{0}b^k


Que também pode ser expresso como:

\displaystyle (a+b)^n = \sum\limits_{k=0}^n {n \choose k}a^{n-k}b^k

O autor deixa a demonstração como exercício para o capítulo 10. Nós vamos precisar de alguma ferramentas para poder demonstrá-lo, então, aguarde um pouco para ver essa demonstração mais adiante nesse curso.

.

Leia toda a série do Projeto Matemática aqui.

Deixe um comentário

Seu endereço de e-mail não ficará público