Protecionismo faz mal

As pessoas que defendem medidas protecionistas costumam parar na primeira página da argumentação. Qualquer análise mais aprofundada mostra que o assunto não é tão simples quanto se presume e que, via de regra, proteger a economia doméstica faz mal. Toda a lógica por trás dessa conclusão diz respeito aos custos de oportunidade.

Sempre que impomos tarifas a um setor, restringimos a importação dos bens que ele produz e aumentamos a produção interna. Os ganhos imediatos e mais visíveis são de emprego e renda no setor protegido. Mas como em economia nada é de graça, é de se esperar que estes ganhos tenham algum colateral negativo. Caso contrário, a solução mágica seria impor barreira a todos os bens importados. Assim, aumentaríamos a produção de tudo e estaríamos todos mais ricos.

O que geralmente se esquece é de se avaliar os custos de oportunidade. Quando restringimos a importação de carros estrangeiros, por exemplo, aumentamos a produção interna e criamos empregos no setor automobilístico. O problema é que agora as pessoas terão que comprar carros nacionais mais caros (sim, mais caros: caso fossem competitivos não precisariam de proteção para ganhar mercado), sobrando menos renda para consumir com todo o resto. A consequência pouco observável é a perda — ou menor ganho — de emprego e renda em todos os demais setores.

O segundo efeito pouco óbvio à primeira vista vem do câmbio: importamos carros em dólar e compramos carros nacionais em real. Para converter uma moeda em outra é preciso trocá-las no mercado de câmbio. No exemplo dado, a partir do momento em que se impõe uma barreira às importações, reduz-se a demanda interna por dólar e a oferta de real. As pessoas estarão trocando menos moeda nacional por estrangeira pra importar carros. Essa interação entre oferta e demanda monetária irá apreciar o real em relação ao dólar, e isto por sua vez irá prejudicar todos os setores exportadores, que perderão empregos e escala.

Pense um pouco e veja o quanto é óbvio: nós não obtemos moeda estrangeira para queimar ou enterrar. Usamos essas divisas para adquirir bens e serviços do exterior. É de se esperar que, de alguma forma, ao dificultar a saída de divisas, também prejudiquemos a entrada. Ou alguém espera que surpreendentemente os dólares comecem a se acumular aqui dentro em pilhas por causa de uma tarifa? Como isso aconteceria e com que finalidade as pessoas agiriam assim?

Tendo em mente essa ideia, fica claro que o efeito líquido de emprego e renda de qualquer medida protecionista precisa ser avaliado tanto em ganhos para o setor protegido quanto em perda para todos os outros setores — incluindo as famílias que agora terão que desembolsar mais por produtos de pior qualidade.

Esse efeito líquido sempre é negativo por 2 motivos:

(1) Protegemos, por definição, setores menos eficientes que os estrangeiros, o que reduz a eficiência média da economia. Além disso, o colateral é a perda de empregos nos setores até então exportadores, os quais já eram capazes de competir a nível global. Em suma, trocamos empregos mais produtivos por empregos menos produtivos.

(2) Ao dificultar a entrada de bens estrangeiros, tornamos a concorrência mais nacional e menos global. Setores menos concorrentes são, ninguém ousaria negar, menos eficientes.

Tragicamente, os ganhos locais são bem visíveis e as perdas gerais são muito diluídas. A tendência é que cada grupo de interesse que representa um setor tente “puxar a sardinha” para o seu lado, num frenesi sem fim em que todos tentam ganhar às custas de todos os demais. O resultado é o país inteiro mergulhado em burocracia e ineficiência — como foi na década de 80 e ainda é, mas em menor escala.

É verdade que, em alguns casos muito específicos, esse sacrifício vale a pena no médio prazo porque permite às firmas protegidas penetrar em áreas novas, tornando-se competitivas a nível internacional e, em pouco tempo, a proteção deixa de ser necessária. Mas esse caso hipotético é algo tão atípico que sua “solução” jamais deveria ser transformada em política de Estado. E se posta em prática, que seja de forma democrática (a sociedade consente em pagar mais caro durante um tempo por bens de pior qualidade), transparente (as empresas agraciadas tem metas de desempenho) e estritamente temporária.

Conclusão

Qualquer pessoa que queira te empurrar alguma tarifa “pelo seu bem” precisa te explicar como que reduzir eficiência e concorrência interna poderia te tornar mais próspero. Caso ela argumente pela abertura geral combinada com proteção temporária no setor x ou y, precisa te dizer detalhadamente como a atuação do Estado é indispensável neste caso. Digo, é realmente verdade que só o poder público consegue tornar viável o surgimento de firmas no setor especificado? Não entraremos no mérito de como se avalia algo desta natureza, mas já adiantamos que muito provavelmente a atuação do Estado não será bem justificada.

.

Leia também:
Livre comércio é sempre bom? O caso das economias externas de escala
Por que livre comércio?
Sobre a relação entre livre comércio e crescimento econômico
A real função do livre comércio é quebrar empresas

Deixe um comentário

Seu endereço de e-mail não ficará público