A importância da poupança para a composição setorial

Um fato estilizado da economia é o seguinte: países que poupam mais também têm uma participação relativamente maior de setores intensivos em capital físico no PIB (manufatura, mineração e utilidades).

O motivo provável envolve a boa e velha vantagem comparativa. Como aprendemos no modelo neoclássico de comércio internacional, os países tendem a produzir e exportar mais dos bens e serviços que sejam intensivos nos fatores de produção que possuem maior abundância relativa. A indústria pesada é um setor altamente intensivo em capital físico, como grandes estruturas, máquinas, instalações. Logo, é esperado que países que revertam uma grande fração de sua renda na acumulação de novo capital, isto é, aqueles que possuem uma alta taxa de poupança, tenham vantagem neste tipo de atividade. Esta previsão é exatamente o que observamos nos dados.

Na China hoje as famílias consomem 38% do PIB e o governo outros 14% (excluindo-se transferências). Todo o restante, os 48% que sobra, ou se torna investimento na própria China ou investimento em outros países; o que neste último caso permite um superávit em conta corrente e consequentemente um câmbio real mais desvalorizado. No Brasil, em comparação, o consumo das famílias gira em torno de 63% do PIB, e o do governo, 20% do PIB. Sobra muito menos para investimento interno ou externo, tornando relativamente mais caro produzir em setores que exigem um grande volume de capital físico. A consequência prática é um juro de equilíbrio mais alto, um câmbio real mais valorizado e uma indústria menor.

Felizmente ter indústria grande não é e nem nunca foi condição necessária ou suficiente para o desenvolvimento. Desenvolvimento é crescimento da produtividade, e isto é possível em qualquer setor. Países que poupam pouco, como o Brasil, podem conviver bem com esta restrição desde que entendam suas aptidões naturais. A alternativa neste caso é apostar em um ambiente de negócios competitivo e em um bom nível educacional.

Já a receita para o fracasso é tentar um modelo de desenvolvimento incompatível com a restrição imposta pela taxa de poupança, se enganando que para ter indústria grande bastaria fornecer proteção ou estímulo. Nós conhecemos bem a receita do fracasso.

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