Mais floresta ou mais agro? Por que não os dois? (parte 2)

O caso alemão

A Alemanha hoje consegue produzir 3x mais cereal em uma área plantada 10% menor do que eu 1961. O segredo? Bem, não há segredo. Como nós sempre dizemos, o que eleva a produção no longo prazo é a produtividade.

Este aumento de produtividade não é exclusividade da Alemanha ou dos países ricos. No mundo inteiro, desde a década de 60, a produção de cereal, em kg por hectare, cresce em média 2% ao ano (fonte). A humanidade vem passando, literalmente, por uma nova revolução agrícola: novos fertilizantes, novos pesticidas, novas máquinas e bens de capital, novas espécies transgênicas, etc. Nunca antes foi possível aumentar tanto a produção para a mesma área de plantio, e o processo está em curso, a todo vapor. Isto é desenvolvimento de longo prazo: incremento na tecnologia, na eficiência, na produtividade.

E pensar que, num cenário otimista como esse, há quem ache razoável sacrificar pedaços da maior floresta tropical do mundo para aumentar a produção.

O caso brasileiro

Até a década de 90 o Brasil era importador líquido de comida. Hoje nós somos o maior exportador líquido de comida do mundo, com um superávit na balança comercial de aproximadamente US$77 bilhões em 2017. O que exatamente mudou de lá pra cá?

Basicamente houve um enorme aumento da produtividade, medida em tonelada por hectare. No gráfico abaixo temos a evolução da produtividade da terra em algumas culturas entre 1962 e 2016 para o Brasil, tomando 1962 como base 1, segundo dados das Nações Unidas. Como se vê, o mesmo solo hoje é capaz de produzir 3x mais do que em algumas décadas passadas.

Foi este processo de aumento da produtividade que evitou a armadilha malthusiana prevista no século XIX. O mundo produz hoje dezenas de vezes mais alimentos do que produzia séculos atrás, mas não por ter multiplicado dezenas de vezes as áreas de plantio. O que nós aumentamos vertiginosamente foi a produtividade dos fatores (da terra, do capital e do trabalho).

Um aumento de x% na área plantada aumenta menos que x% a produção, dado o rendimento marginal decrescente do insumo terra. No longo prazo, o que de fato eleva constantemente o produto, seja na agricultura ou em qualquer setor, não é o aumento dos insumos de produção, mas sim o aumento da produção por unidade de insumo; que só é possível através de incrementos na tecnologia e na eficiência. O Brasil poderia optar pela estratégia de aumentar a produção abrindo novas áreas de plantio em áreas de preservação, mas este incremento na produção seria temporário, e certamente resultaria em externalidades negativas nefastas, que envolvem até os ciclos de chuva nas região mais populosas do país. Além disso, teríamos que conviver com a destruição de um ativo que pode ter utilidades ainda não exploradas: a biodiversidade local.

Apesar de ser um grande produtor agrícola, a produtividade da agricultura brasileira ainda é baixa para a maioria dos setores. Há uma enorme possibilidade de aumento da produção por convergência tecnológica com a fronteira do mundo, sem abrir nenhuma nova área sequer. No fim, essa ideia com “usar recursos da Amazônia” mostra que nossa direita política é tão ignorante sobre o processo de crescimento econômico quanto a esquerda. Crescimento de longo prazo é, essencialmente, um processo de acúmulo de novas ideias, melhora da tecnologia e da eficiência.

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